A presunção do autor da contraordenação

O Tribunal Constitucional, através do acórdão nº 172/2021, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no nº 6 do artigo 10º da Lei nº25/2006, de 30 de junho, quando interpretada no sentido de estabelecer uma presunção inilidível em relação ao autor da contraordenação, independentemente da prova que sobre a autoria for feita em processo judicial.

A Lei nº 25/2006, de 30 de junho, aprovou o regime sancionatório aplicável às contraordenações ocorridas em matéria de infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem.

O artigo 10º, sob epígrafe “Responsabilidade pelo pagamento”, estabelecia que “o direito de ilidir a presunção de responsabilidade prevista no nº 4, considera-se definitivamente precludido caso não seja exercido no prazo referido no nº 1”.

Estamos, portanto, perante uma presunção inilidível relativamente ao autor da contraordenação, no sentido em que, sempre que não for possível identificar o condutor do veículo no momento da prática da contraordenação, é sempre responsável pelo pagamento das coimas a aplicar, das taxas de portagens e dos custos administrativos em dívida, o proprietário do veículo, identificado no registo, tornando-se essa presunção inilidível em sede do próprio processo judicial de impugnação da decisão administrativa.

Ora, é certo que no que concerne a contraordenações o legislador se socorra muitas vezes de presunções, justificadas por razões de praticabilidade e eficiência da sanção. Porém, não pode deixar de se apontar que tal interpretação afronta o princípio da culpa, onde o proprietário do veículo registado será sempre responsável pelo pagamento das coimas e das custas, independentemente da sua real participação nos factos e mesmo na ausência de qualquer ligação com o autor da infração à data dos mesmos.

O facto de a norma estabelecer uma presunção inilidível da autoria do ilícito de não pagamento de taxas de portagem, não pode deixar de se ter também como violadora do princípio da presunção da inocência, isto é, o arguido é tido como autor do ilícito independentemente da prova que possa vir a fazer em juízo destinada a demonstrar a sua inocência.

Mais, tal presunção também consubstancia uma violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, pois não permite ao arguido, através do recurso jurisdicional, alterar a decisão administrativa que foi tomada sobre a autoria do ilícito.

Nestes termos, decidiu o Tribunal Constitucional declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do nº 6 do artigo 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de junho.